Dubai, Emirados Árabes Unidos – Mesmo antes de assumir o cargo em Janeiro passado, o Presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva procurou posicionar o seu país como líder mundial na batalha contra as alterações climáticas.

Ele chegou à Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas no ano passado sob aplausos e apoiadores gritando seu nome. “O Brasil está de volta”, disse ele ao público entusiasmado, declarando que a luta contra as mudanças climáticas é “a questão de maior destaque” de sua administração.

Um ano depois, Lula retorna na sexta-feira à conferência anual do clima, conhecida em sua última edição como COP28. Mas os críticos questionam se ele cumpriu as promessas abrangentes que fez no cenário mundial, especialmente à medida que o Brasil continua a desenvolver os seus sectores de petróleo e gás natural.

“O Brasil de Lula da Silva não pode ser ao mesmo tempo um líder climático e o quarto exportador mundial de petróleo”, disse Suely Araújo, especialista em políticas públicas da ONG ambiental Observatório do Clima, à Al Jazeera.

Ainda assim, com líderes mundiais como o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e o chinês Xi Jinping, notavelmente ausentes da COP28, Lula pretende enviar a mensagem de que o Brasil pode organizar esforços para enfrentar a política climática – e preencher o vazio de liderança.

“Chegamos à COP28 de cabeça erguida”, disse Ana Toni, secretária de mudanças climáticas do Ministério do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas, durante uma entrevista coletiva em 8 de novembro.

A Conferência Anual das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, conhecida este ano como COP28, foi inaugurada em 30 de novembro em Dubai, Emirados Árabes Unidos. [Peter Dejong/AP Photo]

Uma demonstração de força

O governo brasileiro já anunciou que o país pretende enviar ao evento a maior delegação de sua história, composta por cerca de 2.400 participantes inscritos.

A maioria provém da sociedade civil ou de organizações empresariais, mas espera-se que pelo menos 400 sejam funcionários do governo, incluindo ministros de alto nível.

A demonstração de força na COP28 contrasta com a participação mais escassa no governo do antecessor de Lula, o ex-presidente Jair Bolsonaro.

O líder de direita, um cético em relação ao clima, não compareceu repetidamente às conferências anuais sobre o clima e, ao assumir o cargo, revogou a oferta do Brasil para sediar um dos eventos.

Bolsonaro também recebeu críticas por supervisionar níveis recordes de desmatamento na floresta amazônica brasileira, onde a destruição atingiu o maior nível em 12 anos em 2020. Aproximadamente 218,4 quilômetros quadrados (84,3 milhas quadradas) de cobertura florestal foram destruídos somente no seu último mês de mandato.

O desmatamento desacelerou no governo Lula, caindo 20% desde sua posse, segundo estatísticas do governo. No início deste ano, ele anunciou um “plano de transição ecológica” que investiria em metas de energia verde e estabeleceu 2030 como prazo para acabar com o desmatamento na Amazônia.

“O governo Lula da Silva já alcançou avanços importantes em termos de reconstrução das políticas ambientais do Brasil”, disse Araújo. “A agenda climática tem tido um lugar central [in his administration] desde sua campanha presidencial.”

O presidente brasileiro Lula da Silva caminha ao lado de um oficial militar, enquanto um militar de camisa azul e outra pessoa esperam para escoltá-lo até um helicóptero.  A arquitetura imponente do palácio da Alvorada, em Brasília, é visível por trás deles.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, à esquerda, embarca em um helicóptero da Força Aérea em Brasília, Brasil, em 27 de novembro, enquanto se prepara para visitar a Arábia Saudita e o Catar antes de chegar à COP28 [File: Adriano Machado/Reuters]

Necessidade de apoio interno

Mas os críticos criticaram Lula por não ter ido suficientemente longe – e por não ter conseguido incluir os principais intervenientes na sua agenda de alterações climáticas.

“Ainda vivemos no país das promessas, não da eficácia”, disse Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), uma coalizão pelos direitos indígenas.

Espera-se que Lula utilize a conferência COP28 para pressionar os líderes mundiais a assumirem maiores compromissos na protecção de florestas tropicais como a Amazónia, que são fundamentais para moderar as alterações climáticas.

Mas Tuxá teme que as propostas de Lula sejam palavras vazias, sem mais apoio político interno.

O Congresso do Brasil é conservador, com o partido de Bolsonaro detendo o maior número de assentos de qualquer grupo na Câmara Baixa. Isto, explicou Tuxá, frustrou os objetivos de Lula de reforçar as políticas económicas do Brasil e promover os direitos indígenas.

“Estamos vendo um belo discurso e talvez até vontade política, mas não há governabilidade”, disse Tuxá.

O líder indígena Puyr Tembe, usando uma coroa de penas radiantes, participa de um painel das Nações Unidas sobre Mudança Climática com o presidente brasileiro Lula da Silva, que está vestido com um terno azul.  Uma tela de TV transmite seus comentários acima deles.
O presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, segundo a partir da direita, junta-se a líderes indígenas como Puyr Tembe, segundo a partir da esquerda, em um painel na cúpula COP27 de 2022 em Sharm el-Sheikh, Egito [File: Peter Dejong/AP Photo]

Mais da metade dos 1,7 milhão de indígenas do Brasil vivem na Amazônia, o que os torna parceiros importantes na luta pela proteção ambiental.

Mas no início deste ano, o Congresso do Brasil votou pela restrição dos poderes das agências federais dedicadas aos povos indígenas e ao meio ambiente. E em outubro, Lula vetou parcialmente a legislação para limitar o que seria qualificado como terra indígena, gerando críticas por não ter rejeitado todo o projeto.

“Entendemos que se trata de um governo de coalizão, mas infelizmente isso dificultou a aprovação de políticas públicas para os povos indígenas”, explicou Tuxá.

Outros grupos também denunciaram o sentimento de marginalização na política climática de Lula.

Tâmara Terso, membro da rede Vozes Negras pelo Clima, disse que seu grupo participaria da COP28 para se manifestar contra o racismo ambiental no Brasil, termo usado para descrever como as comunidades negras enfrentam impactos desproporcionais das mudanças climáticas.

Ela criticou o governo Lula por não incluir uma perspectiva racialmente consciente em seus planos ambientais.

“Embora tenhamos chegado a um ponto de diálogo, ainda existem obstáculos à participação no processo de tomada de decisão”, disse ela. “Esta é a mensagem que levamos para a COP28.”

Um par de mãos se abaixa para reorganizar pilhas de folhetos sobre uma mesa.  Alguns são rotulados "oceano," "água" e "comida."
Representantes de governos, empresas e grupos da sociedade civil participam do dia de abertura da conferência COP28, no dia 30 de novembro, em Dubai, Emirados Árabes Unidos [Rafiq Maqbool/AP Photo]

‘Lavagem Verde’ na COP28

Outros defensores, entretanto, questionaram as mensagens que poderosos grupos de interesse estão a transmitir na COP28. Cinthia Leone, assessora de imprensa da organização sem fins lucrativos brasileira ClimaInfo, destacou a crescente presença de empresas na conferência.

Ela teme que os acontecimentos relacionados com as alterações climáticas possam transformar-se em plataformas de relações públicas para indústrias com pouco interesse em reduzir a sua produção de carbono.

“As empresas aprenderam com a sociedade civil que devem estar presentes nas COPs”, disse Leone.

“Quando chegam, chegam fortes, com muito dinheiro e estratégias de marketing robustas. Isso acaba transformando o evento em uma grande feira onde empresas montam seus estandes para vender seu greenwashing e falsas soluções.”

A acusação de “lavagem verde” – ou de vender um histórico ambiental enganoso – é algo que o próprio Lula enfrenta antes da COP28.

Nicole Oliveira, diretora executiva do Instituto Internacional Arayara, uma ONG, apontou o que considerou contradições na retórica de Lula e nas ações de seu governo.

Um dia após o encerramento da COP28, 13 de dezembro, Oliveira disse que a Agência Nacional do Petróleo do Brasil vai leiloar centenas de “blocos” de território para exploração de petróleo.

“Os blocos a leilão coincidem com áreas preservadas, inclusive algumas no topo dos montes submarinos de Noronha, reconhecidos mundialmente por seu papel na manutenção da biodiversidade marinha”, disse Oliveira. “Nunca esperávamos que tal leilão ocorresse sob este governo.”

Ela também criticou um anúncio do Ministério de Minas e Energia que indicava que o governo Lula pretendia tornar o Brasil o quarto maior exportador de petróleo do mundo.

“Neste ponto da crise climática, deveríamos seguir um caminho diferente, não queimar mais combustíveis fósseis”, disse Oliveira.

Fonte: www.aljazeera.com

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